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"Inclusão por fora "(discurso proferido no I-ERUDS- Sul)

segunda-feira, 28 de novembro de 2011.
Hail Mott! Ave Butler!

Estou voltando agora do I-ERUDS- Sul, encontro ocorrrido no campus UFPR Litoral, em Matinhos (PR). "Voltando" não no sentido fisico e literal, mas já estou conseguindo me recobrar do cansaço e seguir 50% das aulas, entre uma cochilada estratégica e outra. No proximo "post' envio um relato mais completo, com fotos, pois agora estou com "pregui" e estava muito ocupada no evento para clicar as carinhas (ui!). Segue o texto que escrevi e li na mesa final, ao lado do assessor do Jean Wyllis, que admitiu pessoalmente nos meus ouvido o que ja sabíamos: o grande obstáculo para a despatologização das Identidades Trans ( e aos Direitos Civis dessa população) é o CONSERVADORISMO do proprio movimento organizado (ONGs). Não exatamente com essas palavras. A mesa foi marcante na minha vida, pela importância da temática na minha militância e pelos debates e reconhecimento de um tema que é um grande "tabu" na academia.

Segue o texto abaixo, anexarei um filme da fala assim que o achar:

NOTA: Na foto abaixo eu sou a pessoa da ponta direita, olhando para os outros convidados. Alias mesma posição de outra 'trans' que tinha falado na mesa anterior. Só porque não sou marxista o povo acha que pode me jogar na extrema direita kkkk





Sensuais e excitantes tardes!

Meu nome é Dorothy Lavigne (mas pode me chamar de Tonhão) sou estudante e professora de História, meu sonho é formar uma banda de rock e não quero ser vitimizada, apesar de ter uma doença mental. Pelo menos foi dessa maneira que fui apresentad@ num “debate” sobre o polêmico assunto da Troca de Sexo, num programa da TV UFPR do ano de 2010. Só maldosamente esqueceram de mencionar que faço parte de um coletivo internacional, formado por militantes de todo mundo, entre médicos, psicólogos, cientistas sociais e sobre tudo militantes, que, cientificamente embasados, denunciamos a ideologia policialesca, normativa e reacionária mal-disfarsada por este status de “enfermididade “.

Assim, a TV UFPR, mais uma vez seguindo a lógica hegemônica e o senso comum, tratara de invisibilizar vozes dissonantes no interior da própria academia, infantilizadando e ignorando estrategicamente autores e militantes que tem um outro ponto-de-vista. Preferiu-se a isto, incluir na mesa de debate uma teóloga que tinha contra o discurso médico normatizador, apenas a fala de que somos “pecadores” e num espaço que se propunha como debate cientifico qualificado. (aliás, uma primeira provocação: o que vem a ser um debate científico qualificado?)

A partir dessa duvida sobre o caráter da ciência e da intelectualidade na contemporaneidade, que me proponho a falar não como acadêmica, mas como militante. Farei questão de não enumerar autores e pesquisas, mas discursar partir de um local de fala, como militante e como sujeito forjado e moldado por um discurso que naturaliza a dicotomia “masculino versus feminino” . Afinal só a luta verdadeiramente justifica a vida e quem milita não envelhece

Ainda na primeira noite do ERUDS, assistimos a um filme que entre outros personagens, mostrava uma pessoa auto-definida e circunscrita no perfil medico-clinico como uma “mulher trans”. Esta aparição me pôs a pensar, pois nossa heroína, num determinado momento, afirma e demonstra com sua performance “absolutamente feminina” (seja lá o que isso signifique), que a única coisa que a separava da felicidade de ser um individuo completo era a “bendita” cirurgia. Dois anos se passam e descobrimos que nesse ínterim ela fora assassinada, sem conseguir realizar o seu sonho, aquilo que parecia ter se tornado o centro de sua existência, e que se resumia ao retorno à humanidade, o direito a ter um corpo intelegível, com o qual poderia se relacionar a contento com os outros e a realidade a sua volta.

Dessa forma, um numero incontável de pessoas desperdiçam suas curtas vidas tentando se adequar a um mundo hostil, que paradoxalmente as segrega, e ainda movimentam um promissor e lucrativo Mercado da Normatização, que abre espaço para a ascensão econômica de vários profissionais e especialistas, entre cirurgiões, endócrinos, psicólogos, assistentes sociais e talvez futuramente (falo com sarcasmo) economistas e teólogos.

Precisamos nos lembrar, quando falamos em Políticas Publicas, que o Estado que viabiliza cotas sociais e polticas afirmativas nas Universidades é o mesmo que faz vistas grossas as travestis diariamente espancadas e mortas nas nossas ruas e que invade as mesmas Universidades para agredir estudantes “maconheiros e baderneiros”. Esta será aqui a tônica do meu discurso: como diferenciar ações inclusivas daquelas repressivas e coersivas; políticas de controle do Estado e controle social?

Não terei tempo de mostrar quais os custos sociais da eminente revisão do conceito patologizante da transgeneridade, da travestilidade e da transexualidade, pois já os resumi no oficurso por mim organizado. Mas poderia denunciar mais uma vez, que os especialistas  responsáveis por esta decisão em 2013, tendem a ser favoráveis ao retorno do “homossexualismo” na lista de doenças mentais. Aliás, é interessante observar que a transexualidade como problema começa a ganhar peso no discurso médico, ao mesmo tempo que a homossexualidade dessde deste palco. Seria uma estratégia perversa de trocar um ator social pelo outro, uma vez que @s ‘trans’ seriam uma minoria dentro de outra minoria? Por outro lado, considerando as terapias de “cura” de transexuais adultos e crianças tradicionalmente ligada a idéia de garantir a manutenção da heteronormatividade (“mas vocês querem fazer a cirurgia para virar gays?”), seria legitimo indagar se realmente a homossexualidade está despatologizada ou se apenas mudou a estratégia normativa?

Nós, que propomos mundialmente rico debate sobre o tema, não o resumimos à questão médica, mas a colocamos no centro do debate, por entendermos que todos os direitos humanos perpassam a medicalização e alguma forma de legitimação ou justificação social . É o laudo técnico que traz a pessoa atestada de volta a humanidade binária, é o processo que permite a intelegibilidade dos corpos no sistema de Previdência Social. É com um laudo debaixo do braço que se pode encontrar uma identidade e um espaço num modelo cosmológico fixo baseado na existência de APENAS dois formatos possíveis de corpos, e sempre inclusos num projeto heteronormatizador.

Um exemplo que tem enfrentado no espaço da escola e da Universidade é a do tão falado nome social. Trata-se de uma tentativa desesperada de incluir “oficialmente” uma alcunha no lugar do próprio nome. O nome social é, literalmente uma farsa, pois tenta-se trocar no discurso politico, um Direito Humano fundamental por um mero paliativo. Não funciona porque as instituições, no capitalismo de mercado neo-liberal, não estão alheias ao cotidiano do cidadão, tanto na esfera publica, quanto na privada.

Por exemplo, na hora de fazer a inscrição para este evento, precisei sacar meu RG e denunciar minha situação enquanto “Deficiente de gênero”. Porém, o aspecto mais perverso dos processos de assimilação social ,repousa no fato de que condição “sine qua non” para o acesso é a identificação e catalogização do sujeito. Recentemente, Martha Suplicy apresentou no Congresso um “pacote” de leis para a população LGBT que incluía uma garantia de alteração do nome civil, desde que a necessidade de tal mudança tivesse como base jurídica a apresentação de lados que indicasse a pessoa sofrer de Disforia (inadequação entre sexo biológico e gênero psíquico- como se fossemos todos naturalmente obrigad@s a esse tipo de sintonia)

O que mais me preocupa é o contexto histórico que vivemos. A “História Magistra Vitae”( Historia Mestra da vida) é a prova de que o ser humano é tão irracional que sempre acaba repetindo os mesmos erros. A história demonstra que em períodos de grandes crises econômicas e sociais, como a que vivemos hoje, os setores reacionários buscam literalmente dizimar os sujeitos “que sobram”, os mais abjetos, sempre começando pela base da pirâmide social. É neste contexto tenebroso que se incluem as formas de medicalização das pessoas LGBTQW27 , assim como se incluíam os discursos na Antropologia Criminal a 100 anos atrás. No começo do século XX se usavam réguas e uma biologia distorcida para “comprovar” a deficiência moral d@s negr@s. Hoje se usa tomografia computadorizada para melhor definir como adequar nossos corpos e como heteronomatizar a nossa população .

Termino deixando algumas provocaçoes a audiência: o peso politica que segmentos conservadores da sociedade poe sobre a necessidade da manutenção do status de “anomalia” as identidades trans, poderia ser uma ponta solta, uma estratégia para continuar debatendo a homossexualidade como doença, possibilitando uma hipotética futura (re)patologização? Por que nós precisamos de laudos psicológicos para ter acesso a direitos básicos, incluindo trabalho, educação, lazer, e os gays e lésbicas não precisam? E principalmente, será que corremos o risco de Bolsonaros e Malafaias fazerem essa mesma pergunta?



Na foto acima: eu ministrando (kixikeeeeee) o oficurso "Medicalização, Polícias de Gênero e Estratégias de Resistência" , sobre a Campanha Mundial pela Despatologização das Identidades Trans. Dessa vez me pegaram na esquerda, mas sempre nas trevas do limbo!

Sejogai-vos! Desbundái!
*No closet!
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