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O gênero "revolucionário" e a macheza institucional (2ª parte)

sexta-feira, 7 de março de 2014.
Ave Butler! Hail Derrida!

Segunda parte de uma série de duas postagens especiais em anti-comemoração do 8 de Março-Dia Internacional da Mulher "Trabalhadora" (como se não o fossemos todxs), explicando por que não construo essa data reacionária:

(continuando...)

Então qual seria a solução? Como fazer mudanças profundas na sociedade sem empoderar este tipo de discurso? Qual a tática mais apropriada? Eu vejo duas opções que não são contrárias, nem inter-excludentes, pelo contrário, podem até se juntar numa tática só: pacifismo e redefinição/desvirilização da violência. Isso sim é revolucionário por que quebra com paradigmas muito bem calcados na mente das pessoas. Porque não seguimos o exemplo de Mahatma Ghandhi e fazemos greves de fome silenciosas na frente das prefeituras e marcos de nossas cidades? Garanto que seria bem mais construtivo que continuarmos quebrando coisas dos outros, que pertencem à comunidade, chamaria mais atenção da mídia e apoio da sociedade. E se a policia vier nos bater ou dar voz de prisão, sigamos o exemplo do Cabo Daciollo, militante que se destacara na greve dos bombeiros em 2011, apanhemos calados em frente das câmeras, pois como diz o ditado “quem parte para a ignorância, perde a razão”. A violência viril é monopólio do Estado e da policia (cuja truculência é a única razão de existir). O monopólio da razão pertence aos oprimidos, explorados e excluídos.
                                                      
Vieram me mostrar até (quem diria...) o Levante de Stonewall, aquela defesa do "vicio burguês do homossexualismo" como um exemplo de como a violência pode ser um meio útil de alcançar vitórias políticas. Concordo em parte, pois este episódio também é um belo exemplo de como a idéia varonil de “violência justa” pregada pela esquerda radical pode e deve ser desmontada. Stonewall foi um marco singular, exatamente porque se propôs a romper com uma das mais duras e profundas estruturas sociais, a opressão de gênero, a subalternização do feminino. E pela tática de empoderamento e reprocessamento dos xingamentos à que aquela população se expunha cotidianamente, pela “guerrilha da linguagem”, podemos afirmar que foi a primeira Revolução ”Queer” da história. Houve bombas caseiras e barricadas, mas aprendemos a usar armas mais potentes chamadas “perucas”, “batom” e “salto alto”. 

Enquanto  noutros eventos se usava e ainda se usa de imprecações desrespeitosas para com as minorias sexuais e as mulheres, as bichas do Village desfilavam de forma exuberante na frente da polícia, cantando "I Will Survive" “Somos as Bonecas de Stonewall”. De modo algum fora um episódio classista, porque, apesar de toda uma diversidade política presente, a motivação, o ensejo, coesão e coerência às manifestações fora a busca pelo direito à consumir num bar. Dizer que Stonewall foi um evento classista é tão surreal quanto afirmar que os atuais "rolezinhos" são anti-capitalistas. Stonewall pareceu mais um levante “pró-pink-money” que uma revolução bolchevique- aliás, segundo um dos remanescentes, “que terminou antes de acabar”. Discordo, o espírito pacifista de Stonewall esteve presente ás mobilizações de 2013, alias foi o responsável pelos poucos avanços que tivemos nas consciências. Sobre O Junho de 69 teremos um artigo bem caprichado mais além, por ora evidencio que não foi nada ligeiramente parecido com aquilo que a esquerda revisionista aponta.
"Virilidade revolucionária? Me poupe"

Para se ter uma idéia do nível de virilismo e dominação masculina imposto pelo processo revolucionário, basta erguer os ouvidos à frases "inspirativas" tais como "a revolução só será feita com saaaangueee!". Mais testosterona do que sangue, digo eu, com sangue de gente inocente, porque a história demonstra que os mais radicais sempre se escondem nas suas casamatas quando a violência explode. Um indivíduo acaba de me "informar" que não haviam cartazes nem panfletos durante a Revolução Francesa (oi?!). Pelo contrário, a invasão das Tulherias nada mais foi que um levante muito mal organizado, sem o menor cuidado de raciocinar a conjuntura (vulgo "porralouquice juvenil"), que veio a coroar séculos de iluminismo.E que só deu certo, só mudou alguma coisa militarmente, devido ao fator-surpresa: o rei perplexo e assustado resolveu fugir de Paris ao invés de mandar as tropas aniquilarem os revoltosos, o que seria feito muito facilmente. Eu leio isto no Facebook ouvindo a Marselhesa de fundo só pra demonstrar que não houve nenhuma produção cultural no evento que não se resumisse à sangue e virilidade...

Revolução (a genuína) nada mais é que mudança de paradigmas, um momento no qual as pessoas deixam
de pensar de um maneira para pensar de outra. Ora, quando um PSEUDO-revolucionário parte para a "ação direta", fechando qualquer espaço de debate e construção coletiva, vira as costas para a classe que diz defender e para as minorias que diz respeitar. Ignora que suas atitudes negam o caráter salvífico das idéias livres. Seu autoritarismo viril nega-lhe o direito de se autodenominar "revolucionário", pois sua atitude, no tocante ao gênero é extremamente conservadora. Empodera-se à quem já tem poder. Toda forma de violência viril é patriarcal. É através da demonstração de atos de virilidade e bravura que o menino aprende desde cedo a ser homem, a oprimir os mais fracos, a comandar as mulheres. Uma revolução para ser feminista precisa antes de tudo ser pacifista, ou ao menos romper com a ideia de "violência justa" pregada pela Esquerda Revolucionária- ou seja, pelos homens viris que sempre estiveram no Poder. ISTO, destruir a cultura da virilidade, é luta real contra o tal machismo.

(Enterro de militante sírio. Aonde está o Wally? Aonde estão as mulheres?)


Diferentemente do um professor que certa vez me explicara em sala de aula que, para o revolucionário de esquerda não há sexo nem gênero, por que todos seriam iguais nas tarefas, replico que sim, o revolucionário tem gênero: o gênero troglodita. Tanto é assim que as mulheres são estimuladas a fazerem os mesmos trabalhos que os homens (em teoria) e apresentar o mesmo padrão de performance, usar as mesmas armas, etc..., mas nunca o homem é estimulado a fazer os serviços ditos "femininos". Nunca a luta pacifista é incentivada, justamente por ser coisa de "mulherzinha". Quando em muito se fala na justíssima "divisão do trabalho doméstico", deixando transparecer que para o discurso esquerdista o trabalho culturalmente delineado como feminino é inferior  e desimportante, um fardo desnecessário que deve ser dividido entre todos, ao invés de uma nobre ocupação sem a qual a vida em sociedade torna-se inviável. Aliás tem organização que até hoje discute se é legítimo ou não uma mãe zelosa lavar a camiseta vermelha do filho enquanto ele está na rua enfrentando a policia.Tudo em nome da noção de "progresso" imposto pelo homem branco e barbudo marxista/anarquista.

"sangueee..."
Evidente que não se pode generalizar, no sentido que não existe um homem e uma mulher universal. Também não se pode resumir a biografia de ícones da esquerda como Che, Trotsky e Phroudon à violência contra os "gêneros mais fracos". São símbolos legítimos de esperança para aqueles que os seguem, porém o que se vê e o que se denuncia é que no quesito "relações de gênero" a política revolucionária é historicamente a mais desastrosa, tanto no discurso, quanto na práxis. O foco principal, senão o único da agenda, é a universalização da cultura da macheza, já que os machões não querem abrir mão de seus privilégios. Numa batalha campal entre a juventude da esquerda e a "burguesia", não importa que lado saia derrotado, o discurso virilista sempre sairá vitorioso.. E tal práxis não é nada subversiva, pois (re)condiciona didaticamente a juventude a seguir o mesmo modelo de comportamento sexista tão criticado na sociedade judaico-cristã, homens na frente de batalha, mulheres e minorias brandindo bandeirinhas vermelhas atrás. Considerando as táticas e performances dentro da lógica didática, o partido/coletivo não passa de uma "concessão" social, introduzida pela sociedade cis/heteronormativa e que teria como objetivo formar uma juventude machista e virilista. Como as esquerdas almejam fazer luta contra o machismo, se suas práticas de luta, suas virtudes se baseiam no que há de mais violentamente sexista que são os exércitos e a luta armada?

Um amigo meu, marxista, disse que "precisamos de mulheres na revolução". Discordo, o que os revolucionário precisam urgentemente é do FEMININO na sua práxis. Talvez se prestassem mais atenção às falas das bichas afetadas, aprendessem algo além de repetir a heteronorma como papagaios. Seja como for, me parece uma luz no fim do túnel. Espero que não seja mais uma vez o trem do sexismo vindo em nossa direção.


*Sobre a participação das mulheres na revolução Francesa, encontrei um artigo bem didático e acessível feito pelo Deptº de História da UFF (autoria não assinalada): http://www.historia.uff.br/nec/sites/default/files/A_mulher_e_a_revolucao_fran

=> Leia a 1ª parte: http://covildamedusa.blogspot.com.br/2014/03/o-genero-revolucionario-e-macheza.html

 No closet

Desbundai e putiái!

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